27 de jul. de 2013

Carta do pai de Edward Snowden e seu advogado, Bruce Fein, ao Presidente Obama

 

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Caro Ilmo. Sr. Presidente:

O senhor esta extremamente ciente de que a história da liberdade é a história da desobediência civil à leis ou práticas injustas. Como Edmund Burke pregou, "O triunfo do mal despende unicamente de que os homens bons não façam nada."

A desobediência civil não é a primeira, mas a a última opção. Henry David Thoreau escreveu com profunda resistência sobre a Desobediência Civil: "Se a injustiça é parte da fricção necessária da máquina do governo, que seja,  deixe que passe: possivelmente ela irá se desgastar suavemente e certamente a máquina irá se desgastar. Se a injustiça tem uma fonte, ou uma polia, ou uma corda, ou uma manivela exclusiva, talvez então você deva considerar se  o remédio será pior do que o mal; mas se for de tal natureza que requeira que você seja o agente da injustiça contra um outro, então, eu digo, viole a lei. Deixe a sua vida ser a contra-fricção que detém a máquina.”

A filosofia moral de Thoreau encontrou expressão durante os tribunais de Nuremburgo nos quais "cumprir ordens" foi rejeitado como uma argumento de defesa. Na verdade, a lei militar exige desobediência a leis claramente ilegais.

Um capítulo negro da história da Segunda Guerra Mundial na América não teria sido escrito se o então Promotor Geral dos Estados Unidos tivesse se demitido ao invés de participar dos campos de concentração racistas que  aprisionaram 120.000 cidadãos Americanos Japoneses e estrangeiros residentes.

A desobediência civil do Ato do Escravo Fugitivo e as leis de Jim Crow provocaram o fim da escravidão e a revolução moderna por direitos civis.

Nós submetemos que as revelações de Edward J. Snowden sobre o arrastão de vigilância dos Americanos sob o § 215 do Ato Patriota, do § 702 do Ato de Vigilância da Inteligência Externa, ou que  tenham sido sancionados pela honrosa filosofia moral  de Thoreau e justificações pela desobediência civil. Desde 2005, o Sr Snowden trabalhava  para a comunidade de inteligência. Ele se encontrou numa situação de cumplicidade com um segredo, espionando indiscriminadamente milhões de cidadãos inocentes o que é contrário ao espírito,  senão à carta da Primeira e Quarta Emendas  e a transparencia indispensáveis ao auto-governo. Membros do Congresso incumbidos com o descuido se mantiveram silenciosos ou Delficos. O Sr Snowden foi confrontado com a escolha entre a o dever cívico  e a passividade. Ele pode ter recordado a injunção de Martin Luther King, Jr.: "Ele que passivamente aceita o mal esta tão envolvido quanto aquele que ajuda a perpetrá-lo."  O Sr Snowden escolheu o seu dever. A sua administração vingativamente respondeu  com uma queixa criminal alegando violações do Ato de Espionagem.

Desde o início de sua administração, o sigilo dos programas de vigilância Orwelianos da Agencia de Segurança Nacional haviam frustrado a discussão nacional sobre a sua legalidade, necessidade e moralidade. Esse sigilo (combinado com a impraticabilidade congressional)  provocou as revelações de Edward, que causou um debate nacional que o senhor tardia e cinicamente aderiu. A legislação foi introduzida no Parlamento e no Senado para limitar ou encerrar os programas da NSA [sigla em inglês da Agencia de Segurança Nacional], e o povo Americano esta sendo educado sobre as escolhas de políticas públicas disponíveis.  A grande maioria hoje verbaliza suas preocupações sobre a vigilância de arrastão dos Americanos que foi exposta por Edward e que o senhor ocultou. Nos parece confuso que o senhor esteja processando Edward por ter conseguido o que o senhor disse ser urgentemente necessário!

O direito a não ser  perturbado pela bisbilhotagem do governo - o direito mais valioso entre as pessoas civilizadas - é o pilar da liberdade, Robert Jackson, da Corte Suprema de Justiça, serviu como Procurador Chefe em Nuremburgo. Ele aprendeu as dinâmicas do Terceiro Reich que destruíram uma sociedade livre, e que oferecem lições para os Estados Unidos hoje.

Escrevendo em Brinegar v. Estados Unidos, Jackson elaborou:
A Quarta Emenda afirma: " O direito à segurança pessoal dos indivíduos, de suas casas, papéis, e efeitos, contra buscas não justificadas e embargos, não devem ser violados, e nenhum mandato pode ser emitido sem uma causa provável, apoiados por Juramento ou afirmação, e descrevendo particularmente o local a ser revistado, as pessoas e coisas a serem  apreendidas." 

Esses, eu protesto, não são meros direitos secundários mas pertencem ao catálogo  das liberdades indispensáveis. Entre as privações de direitos, nenhuma é tão eficiente em intimidar a população, esmagando o espirito do indivíduo e colocando o terror em cada coração. A busca e apreensão descontrolada é uma das primeiras e mais eficientes armas no arsenal de todo governo arbitrário. Tudo que um individuo necessita é ter convivido e trabalhado entre pessoas  dotadas de muitas qualidades admiráveis mas privadas desses direitos para saber que a personalidade humana deteriora e a dignidade e auto-confiança desaparecem onde lares, pessoas e possessões são sujeitas a qualquer momento à  buscas e apreenções não anunciadas pela polícia.

Nós portanto acreditamos que o zelo com que a sua administração esta punindo  o Sr. Snowden, por cumprir com a sua responsabilidade cívica, para proteger os processos democráticos e garantir a liberdade, é injusto e indefensável.

Estamos também chocados com o desdenho da sua administração pelo direito, as leis, a justiça e presunção da Inocência com relação a Edward. 

No dia 27 de junho  de 2013, o Sr. Fein escreveu uma carta ao Promotor Geral afirmando  que o pai de Edward estava substancialmente convencido de que ele iria retornar aos Estados Unidos para enfrentar as acusações que foram feitas contra ele, se houvessem três garantias legais fundamentais. A carta não era um ultimato, mas um convite a discussão dos imperativos de um julgamento justo. O Promotor Geral foi desdenhado na abertura com um silencio estudado.  

Nós portanto suspeitamos que a sua administração deseja evitar um julgamento devido á dúvidas constitucionais sobre as aplicações do Ato de Espionagem nessas circunstancias, e às obrigações de revelar ao publico informações classificadas potencialmente embaraçosas sob o Ato dos Procedimentos de Informação Classificada.

A sua decisão de forçar uma companhia aérea civil, que transportava o Presidente Boliviano Evo Morales, a aterrizar na esperança de sequestrar Edward, também não inspira a confiança de que  o senhor esta comprometido em oferecer a ele um julgamento justo. Nem tampouco a sua recusa em lembrar o povo Americano e os eminentes Democratas e Republicanos no Parlamento e no Senado como também o Porta Voz da Casa John Boehner,  a Congressista Nancy Pelosi, a Congressista Michele Bachmann, e a Senadora Dianne Feinstein que Edward desfruta da presunção de inocência. Ele não deveria ser condenado antes do julgamento. E ainda assim o porta voz Boehner denunciou Edward como“traidor.”

A Sra Pelosi pontificou que Edward “violou a lei quando liberou aqueles documentos." A Sra Bachmann pronunciou que, “Isso não foi um ato de um patriota; isso foi uma ato de um traidor.” E a Sra Feinstein decretou que Edward era culpado de "traição" que é definido no Artigo III da Constituição como uma "declaração de guerra" aos Estados Unidos, "ou a aderir aos seus inimigos, dando a eles auxílio e conforto."

O senhor permitiu essas quatro afrontas  ao  devido curso do processo, passarem sem repreensão, enquanto o senhor menosprezou Edward como um “hacker”, espalhando difamações sobre as suas motivações e talentos. O senhor esqueceu o gospel da Corte Suprema em  Berger v. Estados Unidos  em que os interesses do governo " em um processo criminal não são vencer o caso, mas que a justiça seja feita?"

Nós também achamos repreensivel a sua administração processar Edward por Ato de Espionagem, pelas suas revelações, sem distinção daqueles que rotineiramente entram no domínio publico através dos seus indicados do alto escalão, com o objetivo de adquirir vantagens políticas partidárias.  Detalhes classificados dos protocolos do seu predador drone, por exemplo, foram compartilhados com o New York Times impunimente,  para  reforçar  as suas credenciais de segurança nacional. A justiça, observou Jackson na Railway Express Agency, Inc. v. New York: “Os autores da Constituição sabiam, e nós não deveríamos esquecer hoje, que não há maior garantia prática e efetiva contra governos arbitrários e insensatos do que exigir que os princípios da lei que oficiais fossem impor sobre a minoria,  devam ser impostos em geral.”

Sob a luz das circunstâncias amplificadas acima, nós instamos o senhor a ordenar que o Promotor Geral  abandone a queixa  criminal contra Edward, e apoie a legislação para remediar os abusos de vigilância da NSA que ele revelou. Tais diretivas presidenciais iriam marcar o seu momento constitucional e moral mais importante. 

Atenciosamente,
Bruce Fein
Conselheiro de Lon Snowden
Lon Snowden

Tradução: Ana Amorim/ Australia


Enviado por Marcos Loureiro, doutor em educação, em 27 de julho de 2013

foto capturada na reportagem "Verdade está por vir", afirma pai de Snowden em entrevista nos EUA, em 26 de julho de 2013.

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