12 de mai. de 2012

“Que a maior porta é o afecto…” Daniel Russo

 
Dedico o poema “Dos Afetos” de Daniel Russo as notáveis mães que tive a oportunidade e a honra de conhecer ao longo de minha carreira profissional.
Mães muito distintas - transbordantes de afeto e coragem, que foram ao limite de si mesma para proteger seus filhos e filhas da violência.
 
minha heroina
Minha heroina, mãe que mesmo não sabendo nadar se atira em um poço cheio de ferragens para salvar a vida do filho.
Mães que enfrentaram o medo e a vergonha e perambularam por conselhos tutelares e delegacias a fim de interditar a violência que era infligida a seus filhos e filhas, na maioria das vezes, por seus próprios maridos e companheiros.
Mães trabalhadoras e sempre esgotadas, mas que nunca deixavam de levar seus filhos e filhas às consultas em um distante serviço público de saúde.
Mães que recorreram desesperadamente a todas as instâncias possíveis para que uma decisão judicial injusta não obrigasse a sua filha ou seu filho a retomarem o contato, sem nenhuma garantia de proteção, com os pais abusadores.
 
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Mães que não temendo por sua própria vida ousaram denunciar grupos de extermínio que vitimaram seus filhos em Goiás.
Mães, ainda que confusas e fragilizadas, conseguiam ter a força e a virtude de refletirem sobre as violências que elas mesmas comentiam contra os seus filhos e filhas, e num esforço sobre humano conseguiam romper com crenças enraizadas em sua cultura familiar e no seu próprio habitus*, desenvolvendo assim práticas educativas que não se baseavam mais em castigos físicos e humilhantes.
TODAS ESSAS MÃES ME COMOVEM PROFUNDAMENTE, elas me encorajam nos momentos mais duros de minha peleja profissional e me inspiram sempre em minha caminhada pela vida....


DOS AFETOS
Como fazer-te saber que há sempre tempo?
Que temos que buscá-lo e dá-lo…
Que ninguém estabelece normas, senão a vida…
Que a vida sem certas normas perde formas…
Que a forma não se perde com abrirmo-nos…
Que abrirmo-nos não é amar indiscriminadamente…
Que não é proibido amar…
Que também se pode odiar…
Que o ódio e o amor são afetos
Que a agressão porque sim, fere muito…
Que as feridas fecham-se…
Que as portas não devem fechar-se…
QUE A MAIOR PORTA É O AFECTO…
Que os afectos definem-nos…
Que definir-se não é remar contra a corrente…
Que não quanto mais se carrega no traço mais se desenha…
Que buscar um equilibrio não implica ser frio
QUE NEGAR PALAVRAS É ABRIR DISTÂNCIAS…
Que encontrar-se é lindo…
Que o sexo faz parte da lindeza da vida…
Que a vida parte do sexo…
Que o porquê das crianças tem o seu porquê…
Que querer saber de alguém não é só curiosidade…
Que saber tudo de todos é curiosidade malsã…
Que nunca é demais agradecer…
Que autodeterminação não é fazer as coisas sozinho…
Que ninguém quer estar só…
Que para não estar só há que dar…
Que para dar devemos antes receber…
Que para nos darem há também que saber pedir…
Que saber pedir não é oferecer-se…
Que oferecer-se, em definitivo, não é querer-se…
Que para nos quererem devemos mostrar quem somos…
Que para alguém ser é preciso dar-lhe ajuda…
Que ajudar é poder dar ânimo e apoiar…
Que adular não é apoiar…
Que adular é tão pernicioso como virar a cara…
Que as coisas cara a cara são honestas…
Que ninguém é honesto por não roubar…
Que o que rouba não é ladrão por prazer,
QUE QUANDO NÃO SE TIRA PRAZER DAS COISAS NÃO SE VIVE…
Que para sentir a vida temos de esquecer que existe a morte…
Que se pode estar morto em vida…
Que sentimos com o corpo e a mente…
Que com os ouvidos se escuta…
Que custa ser sensível e não se ferir…
Que ferir-se não é sangrar…
Que para não nos ferirmos levantamos muros…
QUE MELHOR SERIA FAZER PONTES…
Que por elas se vai à outra margem e ninguém volta…
Que voltar não implica retroceder…
Que retroceder também pode ser avançar…
Que não é por muito avançar que se amanhece mais perto do sol…
Como fazer-te saber que ninguém estabelece normas, senão a vida?
Daniel Russo




Desde de los Afectos
Daniel Russo en honor a Mario Benedetti

             Que uno sólo tiene que buscarlo y dárselo,
            Que nadie establece normas salvo la vida,
            Que la vida sin ciertas normas pierde forma,
            Que la forma no se pierde con abrirnos,
            Que abrirnos no es amar indiscriminadamente,
            Que no está prohibido amar,
            Que también se puede odiar,
            Que el odio y el amor son afectos
            Que la agresión porque sí hiere mucho,
            Que las heridas se cierran,
            Que las puertas no deben cerrarse,
            Que la mayor puerta es el afecto,
            Que los afectos nos definen,
            Que definirse no es remar contra la corriente,
            Que no cuanto más fuerte se hace el trazo más se dibuja,
            Que buscar un equilibrio no implica ser tibio,
            Que negar palabras implica abrir distancias,
            Que encontrarse es muy hermoso,
            Que el sexo forma parte de lo hermoso de la vida,
            Que la vida parte del sexo,
            Que el "por qué" de los niños tiene un porque,
            Que querer saber de alguien no es sólo curiosidad,
            Que querer saber todo de todos es curiosidad malsana,
            Que nunca está de más agradecer,
            Que la autodeterminación no es hacer las cosas solo,
            Que nadie quiere estar solo,
            Que para no estar solo hay que dar,
            Que para dar debimos recibir antes,
            Que para que nos den hay que saber también cómo pedir,
            Que saber pedir no es regalarse,
            Que regalarse es, en definitiva, no quererse,
            Que para que nos quieran debemos demostrar qué somos,
            Que para que alguien "sea" hay que ayudarlo,
            Que ayudar es poder alentar y apoyar,
            Que adular no es ayudar,
            Que adular es tan pernicioso como dar vuelta la cara,
            Que las cosas cara a cara son honestas,
            Que nadie es honesto porque no roba,
            Que el que roba no es ladrón por placer,
            Que cuando no hay placer en las cosas no se está viviendo,
            Que para sentir la vida no hay que olvidarse que existe la muerte,
            Que se puede estar muerto en vida,
            Que se siente con el cuerpo y la mente,
            Que con los oídos se escucha,
            Que cuesta ser sensible y no herirse,
            Que herirse no es desangrarse,
            Que para no ser heridos levantamos muros,
            Que quien siembra muros no recoge nada,
            Que casi todos somos albañiles de muros,
            Que sería mejor construir puentes,
            Que sobre ellos se va a la otra orilla y también se vuelve,
            Que volver no implica retroceder,
            Que retroceder también puede ser avanzar,
            Que no por mucho avanzar se amanece más cerca del sol,
            ¿Cómo hacerte saber que nadie establece normas salvo la vida?

*habitus - [...] um sistema de disposições duráveis e transponíveis que, integrando todas as experiências passadas, funciona a cada momento como uma matriz de percepções, de apreciações e de ações – e torna possível a realização de tarefas infinitamente diferenciadas, graças às transferências analógicas de esquemas [...] (Bourdieu, 1983b, p. 65). Para Pierre Bourdieu, o princípio da ação histórica não é um objeto que se confronta com a sociedade como algo constituído pela exterioridade. Esse princípio não reside nem na consciência, nem nas coisas, mas sim na relação entre a história objetivada nas coisas e a história encarnada nos corpos. O corpo está dentro do corpo social, mas o mundo social está dentro do corpo”, afirma Bordieu (2001 p. 41).















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